quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Vagas para candidatos afrodescendentes no CACD

Nota nº 746

Vagas para candidatos afrodescendentes no Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata

Fonte: Portal do Ministério das Relações Exteriores
http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/notas-a-imprensa/vagas-para-candidatos-afrodescendentes-no-concurso-de-admissao-a-carreira-de-diplomata

28/12/2010

"No âmbito das iniciativas voltadas à promoção da diversidade de seus quadros, e em consonância com os dispositivos do Estatuto da Igualdade Racial (lei 12.288, de 20 de julho de 2010), o Ministro Celso Amorim assinou portaria que institui reserva de vagas para candidatos afrodescendentes na Primeira Fase do Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata, organizado pelo Instituto Rio Branco.
A iniciativa soma-se ao Programa de Ação Afirmativa do Instituto Rio Branco, iniciado em 2002, que concede bolsas de estudo a candidatos afrodescendentes, com o objetivo de auxiliar na sua preparação para o exame de admissão ao Instituto.
Até o momento, 198 candidatos afrodescendentes foram beneficiados pelas bolsas de estudo, dentre os quais 16 foram aprovados no Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata."

Exposição Guerra & Paz no Theatro Municipal do Rio de Janeiro

A exposição Guerra e Paz trouxe ao Rio de Janeiro os grandes paineis históricos pintados por Cândido Portinari entre 1952 e 1956, que deverão ser restaurados em 2011.
Localizadas no hall da Assembleia Geral das Nações Unidas, as obras foram encomendadas pelo Governo brasileiro para presentear aquela Organização e, em função da reforma da sede da ONU, foi possível trazê-las e expô-las pelo território brasileiro e, em breve, em outros países.

Infelizmente, no momento de inauguração dos paineis, Portinari não pôde estar presente por ter o visto de entrada nos EUA negado, por ser considerado comunista. Envenenado pelas tintas, o artista foi proibido pelos médicos de pintar, mas acabou por realizar as obras Guerra e Paz.

Os paineis, expostos no recém-reformado Theatro Municipal do Rio de Janeiro, são belíssimos, como se pode ver abaixo.








A exposição continua na Caixa Cultural, na rua Almirante Barroso, centro do Rio de Janeiro, até o dia 20 de janeiro de 2011, com uma homenagem a Portinari.










terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Exportações brasileiras batem recorde em 2010, segundo o Governo

economia@eband.com.br

28 de dezembro de 2010.

Exportações batem recorde em 2010

As exportações brasileiras em 2010 bateram o recorde histórico. O balanço foi divulgado ontem pelo governo federal. De janeiro à quarta semana de dezembro, as vendas somaram US$ 197,999 bilhões (média diária de US$ 804,9 milhões).
O recorde histórico em 2008 foi de US$ 197,942 bilhões. Na comparação com a média diária de 2009 (US$ 610 milhões), as exportações cresceram 31,9%. As importações, no acumulado do ano, foram de US$ 179,139 bilhões, com média diária de US$ 728,2 milhões. O valor é 42,3% acima da média de 2009.

Leitura: Brasil e América Central


O livro As relações entre o Brasil e a América Central, de Carlos Frederico Dominguez Ávila, publicado pela Editora Juruá, é baseado na tese de doutorado do autor, apresentada na Universidade de Brasília (UnB). Ávila descreve a posição brasileira diante dos conflitos armados centro-americanos em meio à Guerra Fria, seus processos negociadores e as perspectivas da agenda brasileira na região, entre outros assuntos.


Para quem tem tempo de sobra para se aprofundar no assunto, o livro é boa fonte de informação; para aqueles que estudam para as provas do CACD, talvez textos mais curtos e direcionados possam ter melhor serventia, como os de Amado Luiz Cervo e de Clodoaldo Bueno. Ávila aborda os efeitos de nossa política externa dentro da política doméstica, transcrevendo discursos de parlamentares da época, para embasar o texto.

Os mineiros, o Chile e a integração

(Texto publicado originalmente no periódico online O Estado RJ, em outubro de 2010.)

O mundo inteiro assistiu ao resgate bem-sucedido, neste mês de outubro, dos mineiros soterrados no Chile. Um detalhe que chamou a atenção foi o fato de haver um boliviano dentre 32 chilenos. Não devido ao alto índice de trabalhadores migrantes bolivianos no Chile (e até na Argentina ou no Brasil) que buscam empregos, mas por causa de um fator histórico: desde a Guerra do Pacífico, ocorrida no século XIX, Bolívia e Chile não se entendem. E bolivianos aprendem desde pequenos a odiar o Chile, que lhes “roubou o território e a saída para o mar”.

Desde a Independência, no século XIX, as Repúblicas sul-americanas tendiam a disputar território entre elas e com o Império Brasileiro. As contendas territoriais com o Estado brasileiro, herdadas de Espanha e Portugal, já haviam sido resolvidas por meio de tratados bilaterais de limites e de tribunais de arbitragem internacional até a primeira década do século passado _ sem guerras motivadas por esse fato específico. No entanto, algumas disputas que resultaram em conflitos armados entre as Repúblicas herdeiras de Espanha chegaram ao século XX, como o Conflito de Letícia, entre Peru e Colômbia, e a Guerra do Chaco, entre Bolívia e Paraguai, ambas ocorridas na década de 1930. Percebe-se, dessa forma, que a estabilidade fronteiriça e institucional na América do Sul é recente.

Carlos Mamani, único boliviano resgatado da mina, pode ser o elo que faltava para reaproximar Bolívia e Chile no cenário sul-americano. A partir do momento em que Evo Morales se predispôs a ir ao local de resgate dos mineiros devido à presença de Mamani, houve, de certa forma, solidariedade e aproximação que inexistiam entre ambos os países desde 1978, quando as relações diplomáticas foram cortadas. Para se integrar politicamente a região, é imprescindível o bom relacionamento entre todas as partes. Essa postura foi, ainda, comentada pelo atual ministro de Relações Exteriores do Chile, Alfredo Moreno: "Estes mineiros estão nos ensinando que temos que trabalhar juntos, que na integração está o desenvolvimento".

Além disso, da parte boliviana, Evo Morales declarou sobre o resgate que "estes feitos nos unem, nos fortalecem", e que "a Bolívia nunca esquecerá o esforço do governo chileno, do presidente [Sebastián Piñera] e do povo chileno". Certamente, esse seria um bom momento para reatar laços e fortalecer a integração sul-americana por meio de infraestrutura e comércio, facilitando-se a adoção de uma postura comum em se tratando de temas políticos específicos, como o combate ao narcotráfico (fator de desagregação sul-americana), ao terrorismo e a golpes de Estado, por exemplo. Como conseqüência direta dessa integração, o Estado de Direito nos países da América do Sul e suas instituições democráticas serão fortalecidos.


Alessandra Baldner

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

América Latina se torna novo legitimador do Estado Palestino

América Latina se torna novo legitimador do Estado Palestino
Fonte: Portal Terra
21 de dezembro de 2010

"Em poucas semanas, dois países latino-americanos reconheceram os territórios palestinos como Estado soberano e independente, enquanto outros anunciaram que o farão em breve e cinco estudam adotar a mesma medida, transformando a América Latina no novo legitimador da região perante o mundo.

O respaldo hispano-americano chega em um momento crucial, com as negociações de paz interrompidas há três meses, a contínua expansão das colônias judaicas em solo palestino e a busca por parte da OLP (Organização para a Libertação da Palestina) de novas opções para conquistar a independência diante do pouco êxito de um processo de paz que já dura 19 anos.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi o primeiro a adotar a medida no último dia 3, enviando uma carta ao presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, na qual reconhecia o Estado palestino com suas fronteiras de 1967 (prévias à guerra dos Seis Dias e que incluem a Cidade Antiga de Jerusalém).

Três dias depois, a presidente argentina, Cristina Fernández de Kirchner, fez o mesmo e, um dia mais tarde, o Executivo uruguaio de José Mujica anunciou que seguiria os mesmos passos no próximo dia 7 de janeiro.

Brasília, Buenos Aires e Montevidéu coordenaram sua estratégia com o Paraguai durante a Cúpula do Mercosul, que lançará formalmente negociações para um acordo de livre-comércio com os palestinos.

Na sexta-feira passada o presidente da Bolívia, Evo Morales, também declarou que esta semana faria o reconhecimento formal da Palestina como Estado independente e soberano.

Fontes da OLP disseram à Agência Efe que o Equador também adotará a medida nos próximos dias, enquanto "Paraguai e El Salvador estão a um passo de fazê-lo e o Peru também cogita sua adesão".

No Chile, país que acolhe a maior diáspora palestina fora do mundo árabe, vários deputados apresentaram uma moção pedindo que o Palácio da Moeda aprove o reconhecimento do Estado Palestino, embora ainda seja necessário vencer a reticência do Governo de Sebastián Piñera a fazê-lo conforme as fronteiras de 1967.

A Venezuela já havia reconhecido os territórios palestinos há anos, visto que Hugo Chávez é um dos seus principais apoiadores da criação do Estado.

Dois países reticentes a apoiar publicamente os palestinos são a Colômbia, que depende muito da ajuda militar israelense, e o Panamá, cujo presidente, Ricardo Martinelli, qualificou Israel como "guarda de Jerusalém" há alguns meses, o que criou um sério mal-estar no mundo árabe.

"O reconhecimento da fronteira de 1967 é uma resposta da comunidade internacional para salvar a solução de dois Estados e lembrar a Israel que no século XXI as fronteiras se definem pelo direito internacional e não por colônias", disse à Efe o porta-voz do departamento de Negociações da OLP, Xavier Abu Eid.

A América Latina "tem uma conexão muito forte com a Palestina, historicamente em nível político e social e com este passo importante está colaborando com a paz no Oriente Médio", acrescentou.

Os palestinos não esperam que estes reconhecimentos solucionem todos os seus problemas nem que acabem com a ocupação israelense, mas acreditam que melhorarão sua posição e demonstrarão que o mundo está cansado de esperar uma solução ao conflito que parece não chegar nunca.

"A vantagem de conseguir o reconhecimento de um número importante de países é melhorar o enorme desequilíbrio de poder que temos os nas negociações", disse em entrevista coletiva o membro da equipe negociadora da OLP Nabil Saath.

Pedir às nações que reconheçam o Estado palestino, que declarou sua independência em 1988 e foi reconhecido por 104 países, faz parte de uma estratégia mais ampla "para tornar universal o direito palestino à soberania enquanto busca que a ONU puna a expansão das colônias judaicas" nos territórios ocupados, acrescentou.

Na semana passada, Abbas pediu à chefe da diplomacia europeia, Catherine Ashton, que a União Europeia também reconheça em bloco o Estado palestino.

"Acreditamos que as capitais europeias criaram uma fórmula para nos reconhecer, elevando o grau de nossas representações diplomáticas a embaixadas, algo que a Noruega já fez e que outros três países europeus planejam fazer em breve", disse Saath.
As autoridades israelenses estão insatisfeitas com o precedente aberto pelos países latino-americanos.

O vice-ministro israelense das Relações Exteriores, Danny Ayalon, atribuiu as decisões latino-americanas à "falta de entendimento do que ocorre na região", e assegurou que esses países "deveriam se focar mais no que fazem os norte-americanos e os europeus, que estão mais envolvidos" nas negociações.

Yigal Palmor, porta-voz das Relações Exteriores, disse nesta segunda-feira à agência Efe que Israel "lamenta este tipo de iniciativas", que "danificam a possibilidade de retomar as negociações diretas (com os palestinos)".

"Uma verdadeira solução do conflito só pode resultar de negociações diretas e não de medidas unilaterais", disse o porta-voz israelense, que acrescentou que "sem negociações, não haverá paz"."

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

As cláusulas democráticas e a ordem na América do Sul

(Texto originalmente publicado no periódico online O Estado RJ, em outubro de 2010.)

Mapa de América del Sur (Sudamérica) - mapa da América do Sul - map of South Americaphoto © 2008 Douglas Fernandes more info (via: Wylio)A mais recente revolta popular no Equador, desencadeada pelo corte de subsídios a funcionários da área de segurança pública do país, torna-se, para alguns críticos, motivo de questionamento sobre a instabilidade dos regimes democráticos sul-americanos. Além disso, a crise política equatoriana levou os membros da União das Nações Sul-Americanas (Unasul) a acelerarem a elaboração de uma cláusula democrática para o bloco, com o objetivo de isolar politicamente os Estados cujos governos tenham sido destituídos ou cujas instituições tenham sido atacadas por revoltas que impliquem a interrupção da democracia.

A redemocratização da maioria dos Estados sul-americanos ocorreu recentemente, entre o final dos anos de 1970 e o início dos anos de 1980. Contudo, apesar de eleitos democraticamente, alguns governos, como o de Evo Morales, da Bolívia, de Hugo Chávez, da Venezuela, e de Rafael Correa, do Equador, são vistos como autoritários pelo resto do mundo, o que ainda nos remete à visão de continente com instituições instáveis. Pouco divulgada para leigos, a elaboração de cláusulas democráticas não é novidade no âmbito de blocos formados pelos países da região: os membros do Mercosul instituíram a cláusula democrática no bloco em 1998, devido à tentativa de golpe de Estado no Paraguai.

No caso equatoriano, Rafael Correa ameaçou dissolver o Congresso, o que, segundo especialistas, significaria o enfraquecimento das instituições democráticas locais e propiciaria tentativas de golpes de Estado. As cláusulas democráticas, no caso da Unasul e no do Mercosul, têm poder coercitivo. Mas, mesmo com a tentativa de fortalecimento das instituições locais por meio de atos jurídicos de coerção, é triste pensar que precisamos deste tipo de ato para evitar a interrupção da ordem nas nações sul-americanas.

Nesse caso, é importante a manutenção de projetos políticos, econômicos e de infraestrutura que visem integrar os países da América do Sul. O Brasil, como protagonista do cenário internacional, precisa continuar atuando prioritariamente na sua região, política essa aprimorada pelo ministro Celso Amorim no governo Lula. Quando mais integrados, mais absorvidos pelas instituições, menores são as possibilidades de quebra da ordem constitucional de países membros, porque as outras partes no acordo não deixariam que a desordem se instaurasse devido ao medo de serem também “contaminados” por uma situação indesejada.


Alessandra Baldner

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

A participação do Brasil nas reformas cubanas

(Texto originalmente publicado pelo periódico online O EstadoRJ, em setembro de 2010.)
Ministry of Interior - Che_Cuba 036photo © 2008 James Emery | more info (via: Wylio)


O anúncio do governo de Cuba, neste mês de setembro, de realização de reformas econômicas no país é visto com cautela por parte dos habitantes cubanos. Apesar da demissão em massa de funcionários públicos, a entrada da iniciativa privada no país pode impulsionar a economia da ilha, minimizando os efeitos negativos da mudança, como o aumento do índice de desemprego. As medidas devem alavancar a produção interna, acarretando a melhoria econômica no longo prazo. O interesse demonstrado pela iniciativa privada estrangeira começa a gerar expectativas não só nos cubanos, mas, também, nos empresários brasileiros.

Segundo o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, para evitar que os 500 mil funcionários demitidos pelo governo cubano entrem no mercado informal de trabalho, o Brasil pretende estimular a presença de pequenas e médias empresas brasileiras na ilha. A cooperação entre os dois países é intensa, e ocorre desde 1986, quando foram reatadas as relações diplomáticas Brasil-Cuba. Atualmente, a Venezuela é a principal parceira comercial de Cuba, que também conta com o capital estrangeiro brasileiro, chinês e russo em projetos de exploração de recursos naturais. Percebe-se, então, que o Brasil não é o único país interessado em intensificar a parceria econômica e a comercial com Havana.

O Brasil tem a oportunidade de se firmar como um grande colaborador nas reformas estruturais da economia cubana. Na semana passada, o Assessor da Presidência para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, enfatizou a existência de três projetos brasileiros na ilha, alguns financiados pelo BNDES. O porto de Mariel será reformado pela Odebrecht; a atuação da Petrobras na prospecção de petróleo; e assessoria técnica prestada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) para o plantio de soja em Cuba, visando à segurança alimentar da população cubana.

Dessa forma, o Brasil encontra-se presente em solo cubano em momento crucial para a economia daquele país. Cuba se prepara para mudar seu modelo econômico socialista, baseado em planificação, para adentrar no livre-comércio. E o Brasil, ao investir na ilha, gera empregos e acaba por afirmar sua presença no próprio continente, demonstrando sua preocupação com o desenvolvimento de nossos vizinhos caribenhos. O empresariado brasileiro certamente aproveitará a alta escolaridade da população cubana e, consequentemente, lhe propiciará melhorias na qualidade de vida, tão cara na Cuba atual. Bom para eles e para as empresas brasileiras. Ao realizar investimentos em nosso próprio continente, mostramo-nos ao mundo como um país importante nos cenários econômico e político internacionais.

Alessandra Baldner

A Crise é a oportunidade para restaurar a coerência na governança econômica global

Fonte: WTO News

O Diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, afirmou durante uma palestra no escritório das Nações Unidas, em Genebra, que "essa crise [financeira de 2008] se origina das crescentes quebras da ordem estabelecida como consequência da Segunda Guerra Mundial. Mas eu acredito, inclusive, que isso nos proporciona uma oportunidade de restaurar algum tipo de coerência na governança econômica global".


clique aqui para ler o discurso de Lamy.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

A demanda chinesa pelo pé brasileiro

(Texto publicado originalmente no periódico online O EstadoRJ, em julho de 2009.)

A invasão de produtos chineses preocupa os empresários brasileiros, principalmente os do setor calçadista, que pressionam o governo do Brasil a tomar medidas para proteger a indústria nacional da concorrência chinesa. No entanto, o reconhecimento, em 2004, do estatuto de economia de mercado para a China por parte do Governo do Brasil, dentre outros latino-americanos, é considerado obstáculo ao estabelecimento de mecanismos de defesa comerciais em caso de dumping (prática de concorrência desleal de preços) ou subsídios (auxílio financeiro a produções) porque influencia o processo de investigação de medidas antidumping, ao dificultar a sua comprovação segundo as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC).

A OMC estabelece que o processo investigatório esteja baseado na checagem do preço de exportação da mercadoria para o país que alegue prejuízo em relação ao seu valor normal. Para as economias de mercado, esse valor normal é o preço de venda do produto no mercado interno do exportador, sem taxas. Diferentemente, para economias não reconhecidas como de mercado, o que não é mais o caso chinês para o Brasil, o valor será auferido de acordo com o preço do produto em terceiros países reconhecidos como economia de mercado. Dessa forma, o Brasil deverá considerar o valor do produto no mercado chinês, devido à manutenção, por parte do Estado, de preços domésticos de alguns artigos em níveis artificialmente baixos, o que dificultaria a comprovação de concorrência desleal.

Apesar da dificuldade, não é impossível a comprovação do dumping. Enquanto isso, com o agravamento da crise financeira internacional e a consequente queda nas vendas de calçados chineses nos Estados Unidos, na África e na Ásia, esses fabricantes passaram a escoar a produção para locais onde o consumo não sofreu tanto com a crise: Brasil, Argentina e México. O saldo dessas importações cresce no ritmo de 50% ao mês, com a China liderando 80% desse crescimento, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados). Além disso, a diferença de preço entre o sapato chinês e o brasileiro pode chegar a mais de 400%, e a qualidade do artigo nem sempre é levada em consideração, uma vez que o produto nacional tem a durabilidade de até o dobro do tempo em relação ao importado, apesar de ser mais caro.

As relações comerciais sino-brasileiras não se resumem apenas a calçados e acessórios: a pauta de exportações para o Brasil inclui aparelhos, máquinas e materiais elétricos e eletrônicos, têxteis, brinquedos e couro, entre outros; e as exportações brasileiras para a China se baseiam em minério de ferro, petróleo e soja. Dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) destacam que os chineses importam do Brasil, atualmente, 34,2% da soja de que necessitam, situando-nos como seu segundo maior fornecedor, atrás dos Estados Unidos. Dessa maneira, o fato de os chineses estarem comprando mais itens brasileiros pode prejudicar o tema da proteção aos calçados nacionais.

Não há dúvida de que o reconhecimento da República da China como economia de mercado foi decisão notadamente política. A demanda pelo estabelecimento de parcerias estratégicas, principalmente nas chamadas relações sul-sul, podem comprometer a proteção da indústria brasileira, já que a busca do Governo Lula em inserir o Brasil no processo de redefinição da ordem internacional leva em conta a possibilidade de apoio do governo chinês, um dos cinco integrantes do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). Dessa forma, uma esperada reforma nesse órgão, no sentido de ampliá-lo para a entrada de outros membros permanentes, colocaria o Brasil em posição privilegiada como representante da América do Sul apoiado por um componente mais antigo.

Alessandra Baldner

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Cuba e os investimentos externos

(Texto publicado originalmente no periódico online O EstadoRJ, em julho de 2009.)

Cuba ainda está no centro das atenções, apesar do fim da Cúpula das Américas, realizada em abril deste ano. Os Estados Unidos reiteraram o pedido ao governo cubano para libertar presos políticos e eliminar impostos referentes ao envio de remessas de cubano-americanos à ilha. Após a derrubada de restrições a negócios de empresas de telecomunicações com Cuba, Barack Obama afirmou que a trajetória do país na adesão a organismos multilaterais e o fim do embargo serão processos lentos e vinculados a reformas democráticas na ilha. A cobrança estadunidense para Cuba incluirá respeito aos Direitos Humanos, liberdade de imprensa e a libertação de jornalistas presos por delito de opinião e de mais de 200 dissidentes políticos.

Raúl Castro parece desconfiado. Afinal, o fim da Revolução Cubana implica melhoras econômicas para a população. O motivo para a insistência na mudança política da ilha é simples: expansão de mercado consumidor, com a vantagem da proximidade geográfica entre ambos os países. De acordo com a Câmara Americana de Comércio, as exportações estadunidenses para o país alcançaram, em 2008, US$ 718 milhões, com o milho liderando o comércio, seguido de carne bovina, aves e trigo. Incrível. Um grupo de senadores norte-americanos apresentará legislação direcionada ao impulsionamento agrícola com Cuba, além de pretender incluir a permissão à ilha para pagamento de bens a crédito e o fim da política que exige o pagamento adiantado de produtos importados por Cuba.

A comercialização dos EUA com Cuba só foi possível graças ao Ato de Reformas de Sanção de Comércio e de Aumento de Exportações, que a partir do ano 2000, permitiu a venda de produtos agrícolas para a ilha com uma série de restrições e licenciamento. Dessa forma, o embargo perdeu força e chama a atenção de pequenos e médios produtores rurais estadunidenses. Além disso, o processo de mudança de postura do governo dos EUA em relação a Cuba foi tema da campanha presidencial de Obama e, atualmente, é parte da nova política externa norte-americana. Mesmo assim, o embargo econômico continua após 47 anos, fruto de uma política de segurança durante a Guerra Fria.

Mas os EUA não são o único país interessado em comercializar com a ilha. Venezuela, China, Canadá, Espanha e Brasil têm forte presença em Cuba. Apesar de a Lei Helms-Burton, de 1996, responsável por sancionar qualquer empresa que comercialize com o país e pela internacionalização do embargo, ainda estar vigente, há Estados que, hoje, têm motivos para investir na ilha. A partir de 2004, por exemplo, a China assinou 16 acordos de cooperação e de investimento com Cuba. E, desde o restabelecimento de relações diplomáticas, em 1986, Brasil e Cuba já firmaram mais de 50 acordos de cooperação, a maior parte voltada para as áreas de ciência, tecnologia e saúde. Em 2008, o comércio bilateral entre Brasil e Cuba nos três primeiros trimestres logrou US$ 482 milhões, o equivalente a um crescimento de 58% em relação ao mesmo período do ano anterior.

O possível fim da Revolução certamente melhorará a condição de vida do povo cubano ao impulsionar a economia da ilha. Cuba é o maior exportador mundial de açúcar e, com a queda nos preços do produto devido às crises nas décadas de 1980 e de 1990, o país passou a diversificar os produtos para exportação, incluindo até frutas cítricas, para não manter-se atrelado a somente um item, já que a economia cubana, assim como a maioria dos países latino-americanos, é sustentada pela exportação de produtos primários. Além disso, o turismo, que antes do embargo era essencial para a economia de Cuba juntamente com a exportação de açúcar, voltou a se intensificar e tornou-se alvo de investimentos, principalmente no setor hoteleiro. Boas perspectivas para o país, apesar da crise financeira internacional.


Alessandra Baldner

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Guerra Fria requentada?

(Texto publicado originalmente no periódico online O EstadoRJ, em agosto de 2009.)

O governo brasileiro demonstra preocupação com o alojamento de bases militares norte-americanas na Colômbia devido à falta de esclarecimento, por parte dos Estados Unidos, sobre o objetivo e o alcance de tais instalações. O acontecimento também incomoda outros países da América do Sul, que se reunirão, ainda neste mês de agosto, no âmbito da Cúpula da União das Nações Sul-Americanas (Unasul), convocada por Chile e Brasil para discutir o assunto. A situação relembra os casos de intervenções estadunidenses na América Latina durante a Guerra Fria, finda na década de 1990 com o desmantelamento da União Soviética.

O Brasil deveria se preocupar com assuntos internos de vizinhos? Questões que envolvem países fronteiriços são sempre complicadas. O assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, após reunião com o general norte-americano James Jones, assessor de segurança da Casa Branca, manifestou receio em relação à proximidade entre as novas bases americano-colombianas e a Amazônia, a qual definiu como região de cobiça internacional. Sim, é possível. Mas o tema desperta, também, outros interesses geopolíticos: hidrocarbonetos.

Os objetivos oficiais da extensão do acordo militar assinado entre Colômbia e Estados Unidos são o combate ao narcotráfico e a desestruturação das guerrilhas de esquerda, como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e de grupos paramilitares, parâmetros estabelecidos pelo Plano Colômbia, em 2000. Mas, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, e o presidente do Equador, Rafael Correa, parecem sentir-se ameaçados com a presença estadunidense na região. O receio de Chávez baseia-se não somente em ameaças, mas em possíveis intervenções além-Colômbia, devido às diferenças ideológicas entre EUA e Venezuela. Além disso, o petróleo venezuelano é responsável por cerca de 14% das importações do produto pelos norte-americanos. Para ele (e para alguns especialistas), referências ao Iraque não seriam mera coincidência.

A reativação da Quarta Frota norte-americana, atuante nas Américas do Sul e Central, constitui outro incômodo aos países sul-americanos. Aparentemente, não haveria motivo para esse tipo de atitude, porque vivemos numa época pós-Guerra Fria, de “pax americana”. Cogitou-se o fato à descoberta de petróleo na camada pré-sal brasileira. Também é possível. Fato inegável tem como referência o fortalecimento da segurança dos EUA. Segundo o cientista político Cesar Guimarães em seu livro “Estados Unidos: Visões Brasileiras”, para os EUA, a segurança global torna-se segurança estadunidense, e as políticas interna e externa se complementam. O objetivo seria fortalecer a própria segurança, revitalizar a economia e promover a democracia no exterior. Dessa forma, os EUA passam a liderar a cooperação com outros países em vez de se isolarem.

A título de curiosidade, uma análise realizada pelo Instituto de Pesquisa Internacional de Paz de Estocolmo (SIPRI), revela que os EUA lideram o ranking de gastos com armamentos, em 2008, com US$ 607 bilhões em despesas, o equivalente a 41,5% dos gastos mundiais com armamentos. Definitivamente, os gastos com o Oriente Médio superam expectativas, mas outras nações sentem-se ameaçadas com esse potencial. É o caso de Venezuela e Equador. Durante a Guerra Fria, os EUA realizaram intervenções na América Latina, inclusive no Brasil, objetivando conter a difusão da ideologia comunista. O fim da bipolaridade EUA-URSS acarretou outros tipos de conflitos relacionados com a globalização: o tráfico de drogas e o crime organizado, o terrorismo, a segurança das fronteiras e as imigrações, entre outros assuntos.

Dessa forma, é de se preocupar a atuação estratégica norte-americana na América do Sul. A instalação de bases militares na Colômbia soa assustadora a repúblicas recém-acostumadas com o fim das intervenções em seus territórios. Além disso, o governo colombiano perde legimitidade e parcela de sua soberania com a interferência estrangeira em parte de seu território. Seria realmente lucrativo para os colombianos o combate ao narcotráfico dessa forma? Pelo que se sabe, em troca do alicerce, o Governo Uribe ganharia tratamento preferencial na compra de armamentos de ponta estadunidenses, além de ajuda financeira para ampliar e modernizar as referidas bases militares. Para os especialistas, uma questão de geopolítica dos EUA. Esperemos os esclarecimentos norte-americanos a respeito.


Alessandra Baldner

BRICs: emergentes, sim. Reformadores, também.

(Texto publicado originalmente no periódico online O EstadoRJ, em setembro de 2009.)

Brasil, Rússia, China e Índia, conhecidos como BRICs, reuniram-se no mês de agosto para discutir a necessidade de se reformar os sistemas tributários dos quatro países que, além de serem mercados emergentes, ainda têm em comum a grande extensão territorial, o tamanho das populações e as desigualdades sociais. O debate sobre as reformas tributárias é apenas mais um tema que evidencia a constituição dos BRICs como novos protagonistas no cenário internacional e, consequentemente, o poder do grupo de determinar a economia mundial nas próximas décadas.

Em entrevista ao site de notícias alemão Deutsche Welle, o economista-chefe do Deutsche Bank, Nobert Walter, afirmou que esses países emergentes possuem realmente potencial para provocar deslocamento de forças no cenário econômico global, o que deverá se acentuar nos próximos anos. Essa tendência, segundo o economista, pode ser observada na rápida recuperação das bolsas de valores de São Paulo, Moscou, Mumbai e Xangai, após a queda em 2008, decorrente da crise financeira internacional. Além disso, a busca de uma saída para essa conjuntura mundial por parte dos BRICs tem por função esclarecer que o grupo projeta sua força e influência, modificando, dessa forma o sistema atual. Prova disso foi o debate, esse ano, a respeito do papel do dólar como moeda de reserva (desempenhado desde a Segunda Guerra Mundial) e sua possível substituição.

Juntos, Brasil, Rússia, China e Índia respondem por 15% da economia internacional e detêm mais de 40% das reservas de divisas mundiais, o equivalente a quase três trilhões de dólares. Brasil e Rússia destacam-se, primeiramente, como grandes exportadores de recursos naturais. O primeiro, na agropecuária, o segundo, com hidrocarbonetos. A China consolida-se no setor industrial e a Índia cresce como nas áreas de tecnologia e de serviços. Um relatório feito pelo grupo financeiro Goldman Sachs constata que os BRICs tendem a superar, em termos de Produto Interno Bruto (PIB), as economias do G7, o grupo das sete nações mais ricas do mundo, o que implicaria rápidas mudanças no cenário internacional, tanto políticas quanto econômicas. Assim, pode-se constatar a capacidade dos mercados emergentes, que não devem mesnosprezados.

Françoise Nicolas, economista do Instituto Francês de Relações Internacionais, presume que, até 2020, o sistema global observará a ascensão de superpotências pobres com mais peso econômico, mas desniveladas em relação aos países ricos. Possivelmente, os BRICs continuarão a ser tratados como emergentes inaptos a cumprir exigências em certos assuntos, como meio ambiente, apesar de terem maior poder de decisão política e econômica. Além disso, pessimistas afirmam que esses Estados deverão se destacar no ranking mundial devido a seus PIBs, embora os valores não sejam suficientes para melhorar o padrão de vida das populações.

Em que pese previsões pessimistas a respeito dos BRICs, observamos, atualmente, a atuação inédita de países pobres com grande peso econômico internacional e com capacidade de persuadir politicamente seus pares. Pode-se dizer, assim, que a importância desses Estados definirá as metas do século XXI, tanto sociais e ambientais quanto político-econômicas, desmontando o sistema de Bretton Woods (1944), responsável pelo sistema financeiro atual no qual se destacam as grandes economias emergidas no pós-Segunda Guerra Mundial, como Estados Unidos e países europeus, por exemplo.


Alessandra Baldner

Propriedade Intelectual

Um levantamento recente sobre competitividade em Ciência e Tecnologia feito pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) aponta que o Brasil é o país menos competitivo entre os BRICs em inovação: em uma lista de 13 países, ficamos na oitava colocação. Contudo, estamos à frente das principais economias latino-americanas (Chile, Argentina, México e Colômbia).
De acordo com os dados da pesquisa, o setor privado brasileiro gasta menos do que deveria em inovações, apesar de o Brasil ter potencial inovador na capacidade de criar novos produtos _ lista em que o Estado ficou em quinto lugar.
Vale a pena conferir questões a respeito de Propriedade Intelectual e de P&D no Brasil. Veja o que dizem os especialistas no Programa Brasilianas.Org...

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Matriz Energética

Outro dia assisti ao Programa Brasilianas.Org, na TV Cultura. Os temas abordados são bem interessantes: defesa, nanotecnologia, saúde, software livre, logística, e por aí vai...
Vale a pena assistir.

Brasilianas.Org é veiculado na TV Cultura, às segundas-feiras, às 22 horas.

Abaixo, o programa sobre Matriz Energética, apresentado por Luís Nassif:



Para acessar o Portal do Brasilianas.Org, clique aqui.

A queda do muro e o começo de uma nova era


(texto originalmente publicado pelo periódico online O Estado RJ, em novembro de 2009.)

Ao assumir o poder na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) em 1985, Mikhail Gorbatchov inicia as reformas que levariam ao fim o bloco comunista: a Glasnost (“transparência”), que visava à diminuição da censura, e a Perestroika (“reestruturação”), um conjunto de reparos na economia, prejudicada por décadas de burocracia e de corrupção. O consequente enfraquecimento da URSS proporcionou o reaparecimento dos nacionalismos no Leste Europeu, e os conflitos étnicos, antes contidos pela Potência Comunista, ressurgiram a partir da desagregação do bloco, provocando vários anseios separatistas. Mas o que a Alemanha tem a ver com isso?

Após a Segunda Guerra Mundial, os vencedores (Estados Unidos, França, Grã-Bretanha e URSS) dividiram a Alemanha em República Democrática Alemã (RDA), sob regime comunista, e República Federal da Alemanha (RFA), administrada sob regime capitalista. O muro entre os dois territórios foi construído em 1961 e foi derrubado 28 anos depois. No auge da Guerra Fria, a divisória simbolizou a separação do mundo entre Leste e Oeste, entre comunistas e capitalistas. O desmantelamento político e econômico da antiga União Soviética resultou no início de uma nova era de globalização econômica e na unificação do país dividido por duas ideologias.

Certamente a Alemanha mudou muito desde a queda do muro. A RFA investira nas bases do que hoje conhecemos como União Européia e a Alemanha tornou-se uma potência econômica, que atualmente suporta grande parte das despesas do bloco juntamente com a França. A unificação agregou a parte menos economicamente desenvolvida, a antiga RDA, ao restante do Estado e os alemães ocidentais pagaram por isso: impostos para sustentar o lado mais necessitado, principalmente na área da saúde. Hoje, o território incorporado ainda precisa se desenvolver: as antigas regiões dominadas pela URSS apresentam o dobro de desempregados em relação aos outros territórios, renda per capita equivalente a 70% dos estados ocidentais e migração em massa da mão-de-obra jovem.

Com relação aos outros países do Leste Europeu, a retomada econômica, contudo, não foi tão lenta quanto se imaginava. Em entrevista à rede britânica BBC, o diretor do Instituto da Economia Alemã, Michael Hüther, afirmou que os estados do leste alemão precisam de pelo menos mais dez anos para lograr desenvolvimento econômico comparável às outras regiões do país. No entanto, há quem tenha se desenvolvido com a incorporação ao lado ocidental. Leipzig, capital cultural e econômica da antiga RFA, por exemplo, cresceu com a mão-de-obra barata e, consequentemente, com a instalação de empresas como DHL, BMW e Porsche.

Apesar da defasagem econômica em relação aos estados da antiga RDA, o lado incorporado tende a melhorar paulatinamente. A mão-de-obra barata e a ampliação do turismo local devem contribuir para o incremento da economia na região. No entanto, um problema real é a massa de jovens migrantes, mesmo com a injeção financeira de quase um trilhão e meio de euros nos últimos vinte anos. A unificação da Alemanha saiu cara e o lado mais rico ainda está pagando a conta de anos de estagflação. Mas ninguém disse que sairia barato.


Alessandra Baldner

Novos rumos na União Europeia


(texto originalmente publicado pelo periódico online O Estado RJ, em novembro de 2009.)

A União Européia (UE) deu, neste mês de novembro, passo histórico para a reforma do bloco com a esperada decisão da República Tcheca, país que aderiu ao Tratado de Lisboa após tanto criticá-lo. Dentre as principais mudanças, destaca-se a implantação de liderança mais forte e coesa no bloco, agilidade nas decisões e eficiência em política externa. A UE ganhou seu primeiro presidente permanente, o ex-primeiro ministro belga Herman Van Rompuy, e uma comissária de Comércio Exterior, Catherine Ashton, responsável pela política externa. Já o Parlamento Europeu ganhou poderes de decisão compartilhada em novos setores, como assuntos policiais e judiciais, pesca e agricultura. O que isso muda para o Brasil?

O Tratado de Lisboa estabelece bases comuns para a política externa europeia, diferentemente da rejeição iniciada nos anos de 1960 pelo presidente francês Charles de Gaulle, que temia o enfraquecimento da soberania estatal a partir da implantação de um governo supranacional na Europa. O novo acordo afirma a concordância dos europeus em partilhar uma parte de sua soberania, o que demonstra a continuidade de rejeição a uma supranacionalidade estatal. Até a adesão do Tratado de Lisboa, o setor referente à Política Externa e Segurança Comum, assim como o de Cooperação Policial e Judiciária, tinha por prerrogativa nas decisões a unanimidade, evitando a perda de poder dos países nessa área. O estabelecimento de decisões compartilhadas favorece, inclusive, possibilidade de mudança na Política Agrícola Comum (PAC), responsável pelos elevados subsídios que dificultam as exportações de produtos primários brasileiros para a UE.

A PAC consome atualmente cerca de 40% do orçamento do bloco, e tem a França entre os seus principais defensores. Dessa forma, outros investimentos são comprometidos em função do alto custo da Política Agrícola, a qual já passou por duas reformas pouco significativas para nós. O Brasil quer abertura em mercados de produtos primários, enquanto a UE (e países desenvolvidos em geral) quer facilidades nas áreas de manufaturados e serviços, estabelecendo um impasse que talvez seja resolvido ainda na Rodada Doha. Em que pese o fator cultural e a segurança alimentar, do ponto de vista europeu seria menos oneroso a importação de produtos agrícolas. Mas o incentivo às paisagens rurais e a comida como cultura devem continuar por algum tempo a consumir boa parte do orçamento da UE.


Alessandra Baldner

Copenhague: lucro à vista


(texto originalmente publicado pelo periódico online O Estado RJ, em dezembro de 2009.)

O fracasso da Conferência da Organização das Nações Unidas para Mudanças Climáticas revelou ao público o que especialistas no assunto já previam: a indisposição chinesa e, principalmente, a estadunidense em se posicionarem a favor da redução de poluentes em seus territórios. Assim como o Plano de Ação de Bali, de 2007, o Acordo de Copenhague tornou-se apenas uma carta de intenções, sem valor legal ou significativo.

Essa não é a primeira vez que os Estados Unidos se recusam a colaborar com a redução de gases na atmosfera, não ratificando até hoje o Protocolo de Kyoto, que expira em 2012. Os motivos para a oposição de chineses, de norte-americanos e de alguns países exportadores de petróleo são puramente econômicos. A China precisa financiar seu desenvolvimento com energia barata; os membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) não deixarão seu balanço de pagamentos deficitário; e os EUA lucram de duas formas: uso de energia barata e possibilidade de cultura de produtos tropicais em seu território, devido às mudanças de temperatura.

Quem perde são os países pobres, especialmente africanos, que sofrerão com a desertificação dos solos e com a consequente inviabilidade da agricultura local. Alguns países asiáticos devem padecer de catástrofes climáticas, como aumento na quantidade de tufões e mudança no regime de monções, que já ocorrem com certa freqüência, e inundações. A Europa sofrerá com a escassez de água, mas a Rússia prontamente vislumbra lucrar com o derretimento das calotas polares, que liberará novas rotas marítimas, barateando os fretes, e com a liberação de portos, inclusive militares, no Ártico.

Ninguém disse que o mundo era justo. Contudo, para os ambientalistas e os demais preocupados com as ondas de calor há esperança de prosseguimento das negociações climáticas. Duas reuniões estão marcadas para 2010 e mais duas para 2011. Resta saber se haverá tempo suficiente para cooperação e para o alcance de um acordo positivo. De catástrofes climáticas já bastam os filmes hollywoodianos

Alessandra Baldner

A diáspora brasileira

(texto originalmente publicado pelo periódico online O Estado RJ, em janeiro de 2010.)

O ataque a brasileiros no Suriname, no final de 2009, expõe o problema do expressivo fluxo das migrações irregulares nas fronteiras sul-americanas. De meados do século XIX até a segunda metade do século XX o Brasil configurou-se como país receptor de mão-de-obra estrangeira, no entanto, a partir da década de 1980 a situação é invertida, quando nos tornamos um país de emigração devido ao contexto de estagnação econômica e descontrole inflacionário.

Atualmente, a diáspora brasileira é um dos fenômenos que mais preocupam o Itamaraty.
Dados do Ministério das Relações Exteriores revelam que em 2005, cerca de 2,6 milhões de brasileiros deixaram o Brasil com destino aos Estados Unidos, ao Japão, à Europa Ocidental (Espanha e Portugal) e à América do Sul. No caso das fronteiras meridionais, o Brasil firmou Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados-parte do MERCOSUL, em 2002, para contornar a situação, apesar de o Paraguai recusar-se a assiná-lo. Dessa forma, persiste a contenda entre “brasiguaios” e paraguaios na área fronteiriça.

No caso das fronteiras setentrionais, a questão é ainda mais crítica: há conflitos na região Bolívia-Peru-Acre, na Venezuela, no Suriname e na Guiana Francesa. A maioria dos brasileiros na região é de ilegais que buscam oportunidades de enriquecimento, seja como garimpeiros ou como atravessadores de imigrantes, entre outras possibilidades. Contudo, a ilegalidade migratória é fator de violações de direitos humanos em qualquer lugar do mundo.

A Organização Internacional do Trabalho disciplina relações indistintas entre regulares e irregulares, mas não proporciona meios para regularizar a situação dos ilegais, comum em quase todos os casos. Existe uma dificuldade consensual entre quem recebe e quem envia mão-de-obra, explicitada até no Fórum Global de Emigração e Desenvolvimento, de 2007. Opostamente, a Convenção sobre Relações Consulares afirma que todos os imigrantes têm direito a assistência consular. O caso pode ser resolvido por meio de tratados e de cooperação. Mas para isso, é necessário haver consenso. Até lá, o Itamaraty ainda deve ter muito trabalho.

Alessandra Baldner

Haiti: quem manda no pedaço?

(texto originalmente publicado pelo periódico online O Estado RJ, em janeiro de 2010.)

A coordenação das tarefas de ajuda humanitária finalmente parece estar acertada entre os países que se propuseram a colaborar com o Haiti. Em meio à tragédia que se abate sobre o país caribenho, e quase uma semana após o desastre, tropas brasileiras cuidam da segurança da população e Estados Unidos são responsáveis pela assistência humanitária. Os norte-americanos, que controlam o aeroporto da capital haitiana, já foram denunciados pela França por priorizar seus próprios interesses, e Hilary Clinton defendeu mais poderes aos EUA. Na disputa estrangeira pelo “poder” de administrar o país, como ficam os haitianos, maiores interessados na resolução do caos?

Medicamentos, comida, água e, agora, segurança são prioridades para o povo haitiano, que de pobre passou a miserável. Donativos não faltam e todos querem contribuir. O acesso, dificultado pela destruição está sendo feito somente pelo aeroporto, cuja administração foi assumida pelos Estados Unidos a pedido do presidente René Préval. As tropas da Missão da ONU para a Estabilização no Haiti (Minustah), lideradas pelo Exército brasileiro desde 2004, formada também por outros países, possuem conhecimento acurado do território haitiano, fato reconhecido pelos EUA. Então, por que não deixar as tropas da ONU coordenarem diretamente a ajuda?

A imagem desgastada pelas guerras do Afeganistão e do Iraque associa os norte-americanos a uma índole imperialista em relação aos demais países do globo, principalmente quando as populações locais não apoiam interferência estrangeira constante em seus territórios, conceito ruim constantemente explorado pela mídia internacional. O resultado é a desconfiança que os EUA geram em outras nações. Além disso, a crescente probabilidade de tentativas de fuga de refugiados para território norte-americano é alta, como ocorreu, em 1962, após a invasão da Baía dos Porcos, em Cuba.

Assim, nada melhor do que demonstrar vontade de ajudar os necessitados, nesse momento, de um país americano. Nada melhor do que mostrar a face humana. Os estadunidenses podem realmente estar preocupados com a população haitiana. E por que não? Entretanto, é preciso que haja não somente a vontade de mudar uma face desgastada, mas, também, de ajudar rapidamente a quem sofre. Tempo significa mais vidas, e para isso, cooperação é essencial.

Alessandra Baldner

Caracas: Mercosul, Venezuela e seus desafetos

(artigo originalmente publicado no periódico online O Estado RJ, em fevereiro de 2010.)

A polêmica em torno do governo do presidente venezuelano, Hugo Chávez, que atualmente está perdendo o apoio de parte de seus ex-aliados internos, reacende questionamento a respeito da entrada do país no Mercosul. De acordo com o Protocolo de Ushuaia, assinado no âmbito do bloco, a democracia é condição essencial para Estados-membros participarem dos processos decisórios mercosulinos, e o que se polemiza é a legitimidade do governo venezuelano para ser parte da organização.

No final de 2009, o Congresso Nacional brasileiro decidiu pela adesão da Venezuela, restando somente ao Paraguai definir a entrada ou não do país no Mercosul, devido ao voto consensual. Dessa forma, todos os membros devem estar de acordo com o procedimento a ser adotado. A decisão brasileira baseia-se no pressuposto de que existe democracia na Venezuela. Em caso contrário, esta não poderia ser aceita em função do Protocolo de Ushuaia.

Sob a ótica do Governo brasileiro, a Venezuela é considerada democracia pelo fato de que seu representante foi eleito pelo povo, embora sua administração possa ter adquirido caráter autoritário. Ao contrário, por exemplo, do caso de Honduras, cujo presidente foi retirado do poder, assumindo-o, então, um governante interino sem respaldo das urnas. Assim, por mais que se questionem as atitudes de Chávez relativas ao racionamento de energia ou à censura de imprensa, entre outras, ele foi eleito democraticamente. De qualquer forma, todos os membros do Mercosul têm a ganhar com a entrada Venezuela no bloco.

Avaliada como a terceira maior economia da região, a Venezuela detém as maiores reservas em petróleo e gás natural do continente, apresenta possibilidades promissoras de comércio, principalmente com o Norte e o Nordeste do Brasil, e seu território abrange parte da Amazônia. O país constitui-se, também, como um dos maiores importadores de produtos e serviços brasileiros. Além disso, a ampliação do bloco, com a entrada de Caracas, proporcionará maior dinâmica comercial entre os membros e, provavelmente, a integração energética, temas essenciais para o adensamento do Mercosul. É preciso ter em mente, também, que, mesmo que o governo venezuelano mude, o compromisso assumido junto ao bloco permanecerá como política de Estado, possivelmente pouco suscetível às mudanças de governo.
Alessandra Baldner

domingo, 21 de novembro de 2010

A nova Turquia

(Texto originalmente publicado pelo periódico online O Estado RJ, em junho de 2010.)

O primeiro-ministro turco, Recep Tayyip Erdogan, emergiu no cenário internacional a partir da aliança com o Brasil na assinatura do tratado sobre o polêmico enriquecimento de urânio iraniano, mas se destacou ao condenar publicamente a operação militar mal-sucedida de Israel sobre o navio de bandeira turca, Mavi-Marmara, em maio deste ano, que levava ajuda humanitária à Faixa de Gaza. Este parece ser o momento de ascensão da Turquia regionalmente, fato que desperta a curiosidade do resto do mundo, e provoca temores ocidentais devido à possibilidade de realinhamento da política externa turca às suas origens islâmicas.

Apesar de a Turquia ser um Estado laico, seu atual governo, presidido pelo Partido da Justiça e do Desenvolvimento, de raízes islâmicas, parece aos olhos ocidentais ser responsável pelo início de possíveis problemas, como o voto contra as sanções ao Irã na ONU. Tema este mais polêmico do que o voto, também negativo, brasileiro. Isso se explica pelo fato de que a Turquia é parte daquela região e depende do gás fornecido pelo Irã; diferentemente do Brasil, que está na América do Sul, e pretende uma política externa independente visando à diversificação comercial.

Há cerca de 90 anos o fim do Império Otomano fez com que a Turquia, sua principal comarca, negligenciasse o restante do território do antigo império, voltando-se para o Ocidente. Na década de 1950, o país entrou para a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), um aparelho militar entre Estados anticomunistas constituído no início da Guerra Fria. Atualmente, a prioridade turca é a de ser membro a União Europeia (UE) e, para isso, o Estado estabeleceu, inclusive, acordos com Israel, como “contraveneno a um radicalismo islâmico”.

Entretanto, Erdogan está reformando o país, aparentemente realizando mais feitos que seus predecessores, e sua política externa revela novos rumos após a rejeição da entrada turca para a UE e após a ocupação do Iraque pelos ocidentais. Para os turcos, Erdogan propicia uma espécie de ascensão internacional, bem-vista aos olhos dos habitantes, de um país com importância relativamente pequena no mundo em relação às conquistas do antigo Império Otomano. Um novo orgulho nacional.

Para o Brasil, a relação com a Turquia é estratégica no sentido de se ampliar mercado e competitividade no exterior, ao servir como entreposto comercial devido à localização de seu território: parte na Europa, parte na Ásia. Dessa forma, a afinidade Brasil-Turquia tenderá a facilitar o acesso brasileiro aos continentes asiático, africano e europeu com a (ainda mantida) fama dos turcos de grandes mercadores regionais; além de a Turquia se constituir como um mercado importante, com cerca de 70 milhões de habitantes, e com um Produto Interno Bruto de mais de US$ 600 bilhões. E então, não vale a pena?

Alessandra Baldner

O que há de bom na vizinhança?

(Texto originalmente publicado no periódico online O Estado RJ, em agosto de 2010.)

Há brasileiros e brasileiras que não enxergam potencial econômico em alguns países sul-americanos além da Argentina. O Brasil possui um território extenso, é um grande exportador agrícola, detém tecnologia de ponta na extração de petróleo em alto-mar, mas, apesar de muitos feitos, não é totalmente autossuficiente em alguns setores, como o da produção de fertilizantes, da qual somos tão dependentes para exportarmos produtos primários. Importamos anualmente 50% do fosfato e 90% do potássio consumidos, a um custo equivalente a cinco bilhões de dólares. Por que não suprir essa demanda com insumos sul-americanos?

O Brasil, por exemplo, importa do Suriname alumina calcinata, aplicado em diversas indústrias, como a de refratários, a de esmaltes, e a de fibras e revestimentos cerâmicos; da Bolívia, o gás natural; da Venezuela, derivados de petróleo; do Paraguai, compra parte da energia elétrica gerada pela Usina de Itaipu; do Equador, medicamentos e chocolate; e do Peru, importará matéria-prima para a produção de fertilizantes. Esses são somente alguns exemplos do comércio que o Brasil mantém com nossos vizinhos. Não somos autossuficientes em tudo. Por isso, são necessárias políticas de aproximação e de complementação econômica, como o MERCOSUL e a Iniciativa de Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA).

Se precisamos importar, por que não ajudar os países da região? Durante a época do Império, o Brasil se posicionou “de costas” para o continente americano, voltando-se para a Europa, especialmente para a Grã-Bretanha. Em meados do século XIX, o Governo Brasileiro reformulou seu principal eixo comercial, favorecendo os Estados Unidos ao importar manufaturados e exportar café. Faz pouco tempo que notamos a potencialidade mercantil de nossos vizinhos; pode ser por isso que nós os olhamos com certo desprezo. Na verdade, um desprezo proveniente da indiferença.

Atualmente, observa-se o crescimento do comércio entre blocos em vez de acordos bilaterais. A formação de blocos, como o MERCOSUL, fortalece os Estados para negociarem em conjunto. Dessa forma, o poder de barganha dos grupos comerciais é alto e, além disso, projetos de integração física, como transporte e distribuição de energia, previstos na IIRSA, estão entre as prioridades para o adensamento de relações comerciais na América do Sul. Há tanto potencial em nossos vizinhos para exportar os insumos de que necessitamos que a integração realmente apresenta o seu valor. Por que não nos favorecermos com as oportunidades?

Para o Brasil, o projeto de integrar a América do Sul torna-se, também, assunto de segurança nacional. Investimos na complementaridade econômica entre nossos vizinhos como forma de combatemos o narcotráfico e o crime organizado na região, que é visto por países que demandam maior necessidade de desenvolvimento _ Bolívia, Colômbia, Equador e, atualmente, Peru _ como forma de gerar riqueza. Assim, temos a possibilidade de manter nossas fronteiras protegidas, além de expandir essa proteção aos territórios vizinhos, evitando a entrada de Estados extrarregionais nessas localidades, como prevê o acordo militar norte-americano com a Colômbia para o combate ao narcotráfico em jurisdição colombiana, fato que preocupou os demais países sul-americanos.

Alessandra Baldner

Os “brasiguaios” e Itaipu

(Texto originalmente publicado no periódico online O Estado RJ, em maio de 2009.)

A relação diplomática entre Brasil e Paraguai, dentro e fora do Mercosul, adquire contexto mais amplo do que simplesmente a questão da revisão do Tratado de Itaipu, considerada injusta pelo governo paraguaio. Atualmente, cerca de 450 mil “brasiguaios”, denominação dada a brasileiros e seus descendentes estabelecidos na República do Paraguai, estão ameaçados de expulsão e de terem suas terras expropriadas, segundo o Ministério das Relações Exteriores. Dessa forma, ambos os temas são considerados pelo Itamaraty como prioritários nas relações bilaterais Brasil-Paraguai.

Os conflitos atuais iniciaram-se durante os Regimes Militares estabelecidos em ambos os países: Itaipu, em 1973, com a assinatura do Tratado para a construção da hidrelétrica, e a formação de “brasiguaios”, a partir, também, da década de 1970. Entretanto, os impasses diplomáticos entre Brasil e Paraguai têm raízes mais antigas, na disputa pelo território das Sete Quedas (Bacia do Paraná), iniciada no século XVIII, reaberta durante a Guerra do Paraguai (1864-1870) e “resolvida” com a construção da Hidrelétrica de Itaipu, para a produção de energia em conjunto, e com a transformação das terras em litígio em reserva biológica binacional.

O processo de concentração fundiário na região Sul do Brasil e a construção da hidrelétrica, cujo local fora inundado para formar o lago da represa, deslocaram mais de 40 mil pessoas, que, após receberem indenização, atravessaram a fronteira. Aliados a esses fatores, o baixo preço das terras de boa qualidade e os incentivos fiscais para a agricultura, durante o Governo Alfredo Stroessner (de 1954 a 1989), atraíram ao território paraguaio esses brasileiros, na época, já acostumados à agricultura mecanizada, e que, hoje, respondem por 85% da produção de soja paraguaia.

Contudo, a presença “brasiguaia” provoca há anos desavenças por parte dos camponeses paraguaios. Percebe-se o problema devido ao fato de o Paraguai ser o segundo país com mais consulados brasileiros: sete. De acordo com o Ministério das Relações Exteriores, estima-se que os “brasiguaios” possuam, atualmente, mais de um milhão de hectares no Paraguai, na região fronteiriça com Paraná e Mato Grosso do Sul. A questão das brigas por terras aliada à reivindicação de Fernando Lugo de se revisar os termos do Tratado de Itaipu, pode gerar nacionalismo exacerbado por parte do povo paraguaio, que ainda não se esqueceu do massacre cometido pelo Brasil na Guerra do Paraguai.

Somos vistos pelos vizinhos sul-americanos como potência imperialista na região. Como resolver esses impasses? A dívida de Itaipu será quitada somente em 2023, e o governo brasileiro mostra-se contrário à possibilidade de o Paraguai vender livremente sua parte da energia produzida, devido às regras do Tratado. O Brasil precisa de energia, e Itaipu responde por quase 20% de todo o consumo energético do país. Além disso, o cultivo dos “brasiguaios” representa quase a totalidade da produção de soja no país, fazendo com que o Paraguai se torne o quarto maior exportador do produto no mundo. A possível expulsão de brasileiros em território paraguaio pode acarretar queda nas exportações líquidas do país, e a revisão do tratado de Itaipu certamente será um impasse, porque ambos os Congressos precisam aprovar a mudança e o Brasil não pretende mudá-lo. Dessa forma, o governo Lugo dificilmente tomará decisões radicais.

Alessandra Baldner

Alguém se lembra da Rodada Doha?

(Texto originalmente publicado em julho de 2010, no periódico online O Estado RJ.)

A cúpula do G20 financeiro, realizada em junho deste ano no Canadá, parece ter sido um sucesso ao conseguir a consolidação da reforma do sistema financeiro mundial. Além disso, o comunicado final do evento transcreve a recomendação de se reduzir pela metade os déficits comerciais dos países desenvolvidos até 2013. No entanto, negociações no campo mercantil não avançaram, e a Rodada Doha poderá não ser concluída até o final deste ano. E isso é ruim? Sim. Principalmente para o setor primário exportador brasileiro.

Para quem não se lembra da Rodada Doha, ela foi iniciada em 2001, e há esperança de que seja concluída ainda no final deste ano, sendo a mais longa rodada de negociações comerciais (fora programada para durar até 2005) e a primeira realizada no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC). Também conhecida como a Rodada do Desenvolvimento, expunha o fato de a OMC reconhecer que o comércio é o caminho para os países periféricos se desenvolverem. Contudo, as negociações permanecem estagnadas devido à intransigência de desenvolvidos e de periféricos.

Do lado dos Estados Unidos e dos países-membros da União Europeia, o grande problema reside na dificuldade da eliminação de subsídios agrícolas à produção e à exportação, no caso norte-americano, a situação pode ser facilitada com uma nova Farm Bill (lei agrícola) a ser aprovada em 2012 pelo congresso daquele país (tema bastante discutido com referência à possibilidade de retaliação brasileira aos EUA por causa de subsídios ao setor algodoeiro). Já para a União Europeia, o problema estaria voltado para a segurança alimentar. A retirada dos pagamentos ao produtor é mais complicada devido à questão cultural, por causa das guerras do século XX, e à manutenção da população no campo.

Se, por um lado, EUA e União Europeia são os grandes vilões no impedimento do acesso aos mercados agrícolas, o Brasil figura como vilão, juntamente com a Índia, na questão sobre a entrada de serviços e de produtos manufaturados em seus territórios. Ninguém cede; há claramente um impasse. Doha tem como objetivo liberalizar o comércio mundial, mas após a última crise financeira e as tentativas de se restabelecer as contas internas e externas dos países atingidos, a Rodada parece estar longe de uma conclusão. Depois da declaração de Barack Obama de que não concorda com a conclusão de Doha nos termos atuais, o desfecho da Rodada do Desenvolvimento parece estar bem distante de 2010.

Para os exportadores agrícolas brasileiros, a melhor opção seria buscar novos mercados, como o de Guiné Equatorial, sob regime autoritário desde 1979. Celso Amorim declarou que “negócios são negócios”, e ele está certo. Não significa a legitimação do regime daquele país. Afinal, em momentos de dificuldades comerciais, o Itamaraty já buscou outros mercados (países árabes, africanos, asiáticos e, inclusive, comunistas), sob a presidência de Kubitscheck, Quadros, Goulart, até mesmo Geisel, e hoje sob o Governo Lula. E mesmo Estados desenvolvidos mantêm relações comerciais pragmáticas com países sob regime autoritário. Muitos, inclusive, as mantiveram com o Brasil ao longo do regime militar brasileiro, sem questioná-lo, como os EUA.

Já a entrada da Guiné Equatorial na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) é outra história. Em verdade, ela torna-se mais uma tentativa de protagonismo internacional do Governo Lula, ao tentar fazer com que aquele Estado se transforme em uma democracia para entrar no organismo. Percebe-se que o vínculo comercial muitas vezes tem o poder de forçar uma mudança de regime político. Basta observar os efeitos de sanções comerciais. E apesar das crescentes críticas da mídia a respeito do tema, pode ser uma medida que funcione. Esperemos para saber.

Alessandra Baldner

Os novos nacionalismos

(Texto originalmente publicado no periódico online O Estado RJ, em agosto de 2010.)

A Catalunha, região autônoma espanhola, tornou-se a primeira província a proibir a prática da tourada na Espanha, após muitas polêmicas. Mas o debate sobre o “esporte”, tido como tradição nacional por mais de 600 anos, ganhou contornos políticos, fazendo com que partidos trocassem acusações relativas à oportunidade de separatismo na região. No Leste Europeu, outro caso de separatismo, desta vez concreto, também chamou a atenção da opinião pública mundial para as novas ondas nacionalistas no continente: o Kosovo.
Após a declaração de independência do Kosovo, antiga província sérvia, em 2008, a Corte Internacional de Justiça (CIJ), órgão das Nações Unidas, declarou parecer favorável à autodeterminação kosovar em julho deste mês. O resultado agradou aos albaneses, que representam cerca de 90% da população, e que garantem que prefeririam lutar a serem governados pelas leis sérvias. Em que pese a Sérvia não aceitar a decisão da CIJ, afirmando que o Kosovo é apenas uma de suas províncias em vez de uma antiga república da ex-Iugoslávia, o novo país já foi reconhecido por cerca de 70 Estados.
A questão da Catalunha é um pouco parecida. Apesar de a batalha contra as touradas haver sido iniciada por uma organização de proteção aos animais, o debate foi politizado, havendo quem culpasse os nacionalistas, como o Partido Político Ciutatians, por uma demanda pela autodeterminação regional. A Catalunha é a província mais rica do país, com língua própria (o catalão), e com habitantes descontentes com a limitação da autonomia de Barcelona pela Suprema Corte Espanhola. Desta forma, a tourada ficou em segundo plano, sendo usada pelos separatistas como desculpa e como forma de diferenciar a região do resto da Espanha.
As últimas grandes ondas de autodeterminações ocorreram na segunda metade do século passado, sobretudo em países africanos e em asiáticos, e também após o desmembramento da ex-União Soviética. A contenda do Kosovo, assim como a da Catalunha, demonstra que os nacionalismos continuam mais vivos do que nunca, mesmo que Barcelona não venha a se separar da Espanha. No caso kosovar, após uma guerra de limpeza étnica iniciada pelos sérvios na década de 1990, a separação se tornou inevitável. Contudo, o episódio da Catalunha, embora baseado em necessidades diferentes, demonstra o poder de barganha da província relacionado às imposições espanholas. A limitação da autonomia catalã valeria a pena? Afinal, quem teria a perder, seria a Espanha.

Alessandra Baldner

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O Brasil na América Latina

(Texto originalmente publicado no periódico online O Estado RJ, em setembro de 2010.)

A importância da integração latino-americana para o Brasil, tanto comercialmente quanto politicamente, reflete-se no PIB da América Latina, que corresponde a mais de quatro trilhões de dólares, e nos projetos de infraestrutura que objetivam viabilizar o desenvolvimento da região. Atualmente, 47% das exportações brasileiras de manufaturados têm como destino a América Latina e o Caribe, segundo o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e, de acordo com o ministro, “se não fosse a Alalc, não teríamos hoje América Latina e Caribe e, sobretudo, América do Sul, tão integrados. Por isso, a Alalc não fracassou”.
No final de agosto deste ano comemorou-se cinquenta anos de integração da América Latina no âmbito da Associação Latino-Americana de Livre-Comércio (Alalc) e de sua substituta, a Aladi. Na primeira metade do século passado, Celso Furtado e Raúl Prebisch, fundadores da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) já diziam que era fundamental integrar para desenvolver. Graças a eles, nos anos de 1960, constituiu-se a Alalc, visando ao desenvolvimento industrial e a acordos entre seus membros, com o objetivo de eliminar barreiras entre Estados e de ampliar os mercados regionais. Como consequência deste processo, temos hoje, por exemplo, o Mercosul e a Comunidade Andina de Nações (Can).
Em que pese a visão otimista, ainda é preciso aprofundar esse processo por meio da criação de mais mecanismos concretos e eficazes de financiamentos diretos e indiretos na região, para diminuir a distância econômica entre os países. Temos o Convênio de Pagamentos e Créditos Recíprocos (CCR), criado com o propósito de facilitar o intercâmbio comercial local, por meio da redução de transferências internacionais, utilizado principalmente ao longo dos anos de 1980, quando havia escassez de divisas. E, atualmente, também existe o Sistema de Pagamento Local, que tem o Real como moeda forte, realizado entre Brasil e Argentina, e entre Brasil e Uruguai, o que assegura nossa proeminência na região.
Além disso, o Estado brasileiro oferece sete propostas com o intuito de criar um mecanismo regional de garantias, de seguros e de créditos, pelo fato de a integração constituir-se como tema fundamental para o nosso mercado interno. O que nos interessa é a nossa presença na região, levando, dessa forma, tecnologia e equipamentos para nossos vizinhos com o intuito de diminuir um protecionismo disfarçado por listas de exceções de mercadorias e de reduzir a perda de mercado para a China, cujos poderes comercial e econômico se encontram cada vez mais presentes na América Latina.
Egoisticamente falando, seria uma forma de marcarmos território, fortalecendo, inclusive, nossas empresas. Mas também seria uma forma de propiciarmos o desenvolvimento da vizinhança e o fortalecimento de seus mercados ao agregarmos nossa tecnologia aos seus produtos, evitando, assim, a manutenção das trocas de comércio desiguais com países desenvolvidos. Além disso, vivemos na América Latina. Como potência regional, precisamos dar nossa contribuição. Vide o exemplo da Alemanha em relação à União Europeia.


Alessandra Baldner

O Brasil nas Áfricas

(Texto originalmente publicado no periódico online O Estado RJ, em 16 de maio de 2010.)

Em pleno século XXI, quando as atenções se voltam para a África do Sul, primeiro país africano a sediar a Copa do Mundo, a imagem que a maioria dos brasileiros tem do continente é a de que a África é simplesmente uma mistura cultural homogênea cercada de miséria. Existem nações diferentes, tribos diversas e culturas distintas. As relações Brasil-África do Sul se estreitaram nos anos de 1990, com o fim da política do Apartheid. Os laços brasileiros estabelecidos com aquele continente não se restringem, atualmente, à cultura trazida pelos escravos vindos de lá entre os séculos XVI e XIX. Representam, sim, a possibilidade de ampliar o comércio com a região.

A África Subsaariana, também conhecida como África Negra, cresce entre 5% e 6% ao ano desde 2003, de acordo com dados do Fundo Monetário Internacional, números que superam os de Estados desenvolvidos por causa do chamado “efeito de alcance” das economias da região, responsável pelo rápido crescimento partido de um patamar mais pobre em analogia aos Estados mais ricos. E a África do Sul constitui-se como o país mais abastado daquele continente. Até a China voltou-se para a África, explorando seus recursos naturais e investindo localmente.

Recentemente, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, reafirmou o interesse do Brasil em instalar-se na África. Petrobras, Havaianas, Brasil Foods (fusão das empresas Perdigão e Sadia), O Boticário, Odebrecht, Camargo Correa, Vale, Furnas e Marcopolo são algumas das empresas brasileiras presentes no continente africano. Os produtos brasileiros são bem vistos na África, especialmente por sermos considerados o “primo pobre” que deu certo entre os países em desenvolvimento, e o potencial de consumo do mercado africano é alto. Segundo a Câmara de Comércio Afro-Brasileira, nossos principais parceiros são África do Sul, Angola, Argélia, Gana, Egito, Líbia, Marrocos, Nigéria, Tunísia e Senegal.

No entanto, a política externa brasileira não visa à substituição de seus principais mercados importadores (EUA, Europa e América Latina) pelo africano. Pelo contrário, a intenção é oferecer ao comércio com a África a mesma importância e vulto dos mercados tradicionais com os quais o Brasil negocia, e, dessa forma, ampliar nossas exportações. Assim, é interessante para o governo brasileiro manter de políticas que realizem a chamada cooperação Sul-Sul, como forma de facilitar o entendimento entre os grandes mercados emergentes em desenvolvimento.

Alessandra Baldner